"Naiade à beira-rio"


Fonte:Google


"Hoje, caminhamos à beira-rio da ponte abismal. Íntimos, odorizamos a vagabundez das emoções, que estranhas clamam Natal. É, pois, gémea-palavra de uma Poesia nossa!"
Pertence a Naiade, dedicado a A.


Natal à beira-rio


É o braço do abeto a bater na vidraça?

E o ponteiro pequeno a caminho da meta!

Cala-te, vento velho! É o Natal que passa,

A trazer-me da água a infância ressurrecta.

Da casa onde nasci via-se perto o rio.

Tão novos os meus Pais, tão novos no passado!

E o Menino nascia a bordo de um navio

Que ficava, no cais, à noite iluminado...

Ó noite de Natal, que travo a maresia!

Depois fui não sei quem que se perdeu na terra.

E quanto mais na terra a terra me envolvia

E quanto mais na terra fazia o norte de quem erra.

Vem tu, Poesia, vem, agora conduzir-me

À beira desse cais onde Jesus nascia...

Serei dos que afinal, errando em terra firme,

Precisam de Jesus, de Mar, ou de Poesia?





David Mourão-Ferreira, Obra Poética 1948-1988

Lisboa, Editorial Presença, 1988

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